Frei Otto, 2000, Ingenhoven office | Foto: Ingenhoven und Partner Architekten, Düsseldorf

Frei Otto e a importância de sua obra para a arquitetura contemporânea

Vencedor do último Pritzker, Frei Otto é uma grande referência na arquitetura contemporânea. Com 89 anos, o arquiteto alemão, falecido no último 9 de março, deixa um legado de construções que mostram inventividade até mesmo no campo da engenharia. Suas estruturas são um exemplo para grandes e renomados colegas arquitetos, e sua fama se deu principalmente entre os profissionais da área, pois não era muito popular entre o público em geral.

O anúncio oficial do Pritzker foi uma grande surpresa, pois foi realizado duas semanas antes do previsto devido à morte de Otto. O prêmio é o mais importante da arquitetura e tradicionalmente consagra arquitetos vivos. Entretanto, no caso de Frei Otto, sua morte fez com que ele fosse o primeiro a recebê-lo postumamente.

Apesar disso, Otto soube da conquista – que foi informada com antecedência -, e teria dito a Martha Thorne, diretora-executiva do prêmio:

“Nunca fiz nada para ganhar esse prêmio. Ganhar prêmios não era o objetivo da minha vida. Eu tento ajudar os pobres, mas o que posso dizer, estou muito feliz”.

A citação do arquiteto diz muito tanto sobre o profissional quanto sobre a reverberação de seus trabalhos nesse campo, pontuando alguns caminhos para a arquitetura em geral.

Frei Otto | Foto: von Schlaich
Frei Otto, 1967 | Foto: von Schlaich

Uma de suas obras mais reconhecidas é o Parque Olímpico das Olimpíadas de 1972, realizada em Munique. A estrutura tem grande destaque por combinar com maestria a leveza do desenho com a força da estrutura. Essa característica é uma das mais pulsantes em sua obra, que consegue unir com habilidade o uso dos materiais e a aplicação da arquitetura como recurso humano e biológico.

A nota de homenagem do prêmio ressalta principalmente essas características humanistas de seus projetos. “Inspirando-se na natureza e nos processos nela encontrados, [Frei Otto] procurou formas de usar a menor quantidade de materiais e de energia para demarcar os espaços. Praticou e avançou ideias de sustentabilidade, mesmo antes da existência desse conceito”. Com formação no campo da engenharia, “ele era inspirado pelos fenômenos naturais – desde crânios de pássaros a bolhas de sabão e teias de aranha”. Otto também se preocupou com a necessidade de entender “os processos físicos, biológicos e técnicos que põem de pé os objetos”.

Berlim Stadium
Berlim Stadium | Foto: Pinterest

Suas criações eram especializadas em estruturas maleáveis e membranosas, com avanços pioneiros quando se tratava de matemática e engenharia civil. Em sua vida, também se dedicou não só aos projetos em si, mas à difusão e produção do conhecimento. Os espaços e construções criados por ele serviram de base para estudos e uma profunda influência para os arquitetos de hoje. O prêmio destaca justamente esses “caminhos que foram abertos por sua pesquisa e descobertas. Suas contribuições para o campo da arquitetura não são apenas habilidosas e talentosas, mas também generosas”, justamente por sua difusão de conhecimento libertária, na construção de mentes questionadoras, espírito colaborativo e preocupação com o uso de recursos naturais.

Suas estruturas representam um contraponto direto à arquitetura nazista, do Terceiro Reich. Convivendo no período da Segunda Guerra Mundial, seus estudos foram interrompidos em decorrência dos conflitos, sendo preso em um campo na França após ter sido chamado a cumprir o serviço militar como piloto da Luftwaffe. Ao invés das estruturas pesadas e austeras do governo alemão da época, com ideias grandiosas de “um império para a eternidade”, Otto propôs elementos mais leves e feitos com materiais mais econômicos e maleáveis. As construções, por muitas vezes, foram feitas para exposições ou abrigos.

Mannheim Multihalle
Mannheim Multihalle | Foto: Pinterest

O perfil de seus trabalhos começa justamente com as contradições deixadas pela guerra. Primeiro, uma necessidade básica de um país que precisava lidar com a destruição e abrigar a população após um grande período de mortes, e necessitava de uma resposta imediata para realojar as pessoas que tiveram seus lares atingidos por bombardeios. Por isso, os trabalhos de Otto eram facilmente desmontáveis e com estruturas móveis e temporárias, transformando o período em um elemento agregador e não destrutivo.

As ideias de Otto trabalham o papel dialogal e colaborativo do campo da arquitetura, em que é necessário trabalhar em conjunto e discutir sempre, posicionando suas fortes ideias e tendo o minimalismo como elemento central na fabricação de espaços. Ressaltando ainda o papel de encontros e congressos da área, como esses, para a criação de novas ideias e o compartilhamento de conhecimentos e experiências.

Esses conceitos abrem também grandes questionamentos sobre os rumos da arquitetura contemporânea, principalmente em tempos onde a grandiosidade e o perfil estético dominam muitas das criações. A obra de Otto vai de encontro justamente esse papel da arquitetura em um mundo cada vez mais desigual, no qual mais arquitetos surgem na mesma medida em que mais pessoas estão sem espaços dignos para habitar. Ele deixa uma grande responsabilidade aos arquitetos das próximas gerações, com a ideia de construções maleáveis e com baixo custo, cruciais para o futuro da sociedade.