Uma anomalia que metamorfoseou o jazz, que rompeu barreiras lutando contra o injusto e contra os próprios demônios. Bastava apenas um cintilar nos dedos e todo o restante fazia sentido.

Eunice Waymon começou a tocar piano com quatro anos de idade e nunca mais o deixou de lado. Até nos seus pensamentos o instrumento era o ritmo pelo qual sua vida era movida. Uma sinestesia inexplicável, mas profunda, legítima. O mundo conheceu Nina Simone durante décadas. Agora, o mundo pode reconhecer Nina no documentário dirigido por Liz Garbus, What Happened, Miss Simone? , lançado em parceria com a Netflix.

O documentário jorra emoção já nos seus primeiros minutos e, durante os 101 minutos decorrentes, a possibilidade de identificar-se e comover-se com a história de uma das artistas mais influenciáveis e importantes para o legado da música mundial é grande, quase que irrecusável.

Nina Simone (1)

Tocando na realidade de outrora, conduzidos por depoimentos da própria Nina, conhecemos um pouco mais da história, da vida sofrida, dos abusos, da violência, da segregação e tantos outros problemas reais e identificáveis até hoje, mas que naquela época tiveram proporções desesperadoras, trazendo consequências para a vida pessoal e para a carreira de uma mulher que queria ser uma musicista clássica. No conforto das notas do piano, Nina ganhou sobrevida, tristeza, felicidade, liberdade e prisão. Inúmeros sentimentos amplificados em tom maior e controlados somente nos últimos anos de sua vida.

Nina Simone Kelly, filha de Nina, atuou como produtora executiva no longa e, agindo do bom senso, permitiu liberdade para Garbus conceder a produção de forma livre, revelando todos os lados do cometa musical chamado Nina Simone.

Nina Simone (3)

No cinema, muitas vezes, a categoria de documentários torna-se difícil de ser digerida. Por fatores diversos, mas principalmente pela não linearidade, por existir urgências, diálogos e outros momentos nos quais nota-se a fluidez da narrativa conforme a execução de quem comanda. Neste ímpeto, Liz Garbus mostrou maturidade e sensibilidade suficiente para focar na trajetória da cantora e compositora da melhor forma possível.

Defensora dos direitos civis durantes muitos anos, a vida de Nina foi traçada por muita luta, sacrifícios e dores das quais o ser humano, independente da sua classificação abordada por um manual social, de forma alguma, merece absorver. Mas ela teve a sua cota e sobreviveu. Encantou almas com música, melodia e voz.

Referência musical resultante da fórmula ímpar para preencher o espaço através de notas tangíveis e habilidades fora do comum. Desafiante das certezas, embriagada pelas dúvidas, sonhadora do silêncio, odiosa dos gritos. Senhoras e senhores, é com muita honra e hiperbólico prazer, Nina Simone!

https://www.youtube.com/watch?v=iuN3SGzLGmw