influência da guerra na fotografia

No fim do século XIX, questionava-se como reagir ao crescente fluxo de informações sobre a guerra. Diferente de um relato escrito, em que há uma complexidade de pensamento, de referências e de um vocabulário maior, a forma como as câmeras registram são mais simples: uma foto tem uma língua única e se destina a todos da mesma maneira. “O sofrimento é compartilhado por muita gente e depois desaparece”, escreveu a escritora estadunidense Susan Sontag, uma das referências mundiais do estudo da fotografia.

As primeiras guerras registradas por fotógrafos foram a da Criméia (1854-1856) e a Guerra Civil Americana, no final do século XVIII. Nelas, o combate propriamente dito foi ocultado das câmeras, e o que representava o conflito eram campos devastados e pessoas mortas.

A Guerra Civil Espanhola (1936-1939) foi a primeira com cobertura no sentido moderno: um corpo de fotógrafos profissionais nas linhas de frente das cidades sob bombardeio. A Guerra do Vietnã (1955-1975), por sua vez, foi a primeira documentada por câmeras de televisão, “apresentando à população civil dos EUA a nova ‘tele-intimidade’ com a morte e a destruição”, escreveu Susan no famoso artigo “Diante da dor dos outros”.

A partir de então, imagens de guerras se tornaram entretenimento televisivo. Para Sontag, a compreensão de uma guerra entre as pessoas que não vivenciaram uma é dada pelo que as imagens trazem. A tendência é não nos colocarmos em tais ambientes e, quando tais fatos acontecem à nossa volta, tratamo-nos como “irreais”. Ela cita, como exemplo, os depoimentos do World Trade Center, em que as pessoas frequentemente associam o ataque aos edifícios de Manhattan como um “pesadelo” ou algo “surreal”.

fotografia de guerra

Nessa era de televisão, a fotografia assumiu um papel de recordação, como se tornou a febre do fotolivro nos Estados Unidos e na Europa – hoje, o mesmo começa a acontecer no Brasil. Por isso, elas buscam cada vez mais o impacto, para que sejam estocadas como explicações rápidas para os seus acontecimentos.

“A caçada de imagens dramáticas orienta o trabalho fotográfico e constitui uma parte da normalidade de uma cultura em que o choque se tornou um estímulo primordial de consumo” – Susan Sontag.

A fotografia, diz Sontag, sempre “flertou com a morte”. Sua origem se remonta ao acompanhamento dos últimos dias das pessoas e eram credenciadas pela objetividade, ainda que baseadas em pontos de vista, e no testemunho do real, já que eram tiradas por quem estava vivenciado o momento clicado.

Assim, fotos menos elaboradas são mais bem recebidas como portadoras de autenticidade, porque incitam que não houve tempo para se pensar em estilos ao fotografar a realidade. Encaixa-se nisso a constatação que “a fotografia é a única arte importante em que um aprendizado profissional e anos de experiência não conferem uma vantagem insuperável sobre os inexperientes e os não preparados”. As variáveis dessa constatação são a sorte e a preferência pelo espontâneo.

fotografia de guerra

A identificação correta ou errônea de uma fotografia depende das palavras, ou seja, da legenda. Para uma guerra ultrapassar suas barreiras locais e tornar-se objeto de atenção internacional, precisa ser vista como uma espécie de exceção entre as guerras e representar algo mais do que o choque entre duas forças discordantes, mas entre duas ideias ou etnias, por exemplo.

Por fim, Sontag diz que, exceto a Europa, ainda permanece verdadeiro o fato de as pessoas não questionarem as racionalizações dos seus governos na hora em que eles decidem fazer guerras. Portanto, elas não são impopulares. Quando isso ocorre, o material dos fotógrafos pode tomar sentido de um protesto contra tal conflito ou, pelo contrário, ser símbolo do patriotismo, de forma que “as intenções do fotógrafo não determinam o significado da foto, que seguirá seu próprio curso, ao sabor dos caprichos e das lealdades das diversas comunidades que dela fizeram uso”.