Em meio a trabalhadores, donas de casa e estudantes apressados e suados, a cobradora do circular 940 cantava baixinho enquanto devolvia o troco à passageira que passava pela catraca.

Com seus quase trinta anos, negra, com os cabelos presos num coque muito bem feito e uma sombra azul nos olhos, a cobradora abre um sorriso ao ver um senhor que acabara de entrar no ônibus.

– Alô, Seu Valdemar! Só passeando, hein? – disse, enquanto voltava-se para outra passageira que esperava o troco.
– E você só trabalhando, né? – responde o senhor.

Acompanho a movimentação dos passageiros que vão descer no próximo ponto. É aquele perto da Santa Casa. O primeiro dos três pontos do Centro. Depois que passa por ele, o ônibus segue mais vazio.

– Só trabalhando, Seu Valdemar. – e o sorriso some – Ei, Genilson! – grita, dirigindo-se ao motorista – Pera aí que a mulher vai descer! Essa aí – volta-se ao Seu Valdemar – trabalha um monte também. No hospital, não é, minha filha? – pergunta à senhora que está prestes a descer. Ela concorda. – Vai trabalhar em paz, querida.

Genilson continua pela Rua Nunes Machado. O próximo ponto é perto da Casa da Cultura da cidade.

– No próximo ponto é pá dividi! Metade desce pra lá – apontando a porta dos fundos – e metade desce pra cá! – pela porta do meio.

Não seguro a risada e vejo que o sorriso volta ao rosto da cobradora. Não consigo ver seu nome no crachá que está pendurado em sua camisa azul. Ela lidera os passageiros, o motorista e o dinheiro. Toma conta de tudo, como a mãe que corre atrás de seus filhos de um lado para o outro.

Quando chega ao segundo ponto, os passageiros não se dividem entre as duas portas e acabam se espremendo na porta do meio, o que tira um suspiro da cobradora.

O meu ponto é o próximo. Agora o ônibus tem poucas pessoas. A maioria delas vai descer no terminal. Puxo a corda e a campainha toca. Despeço-me com um sorriso tímido e ela corresponde, levando os cantos da boca até a orelha e exibindo seus dentes branquíssimos.