Minha filha estava na quarta série  e veio  toda feliz, mostrar sua prova  com a nota máxima estampada. Peguei, li e repeti uma das questões constantes da prova. Ela, toda orgulhosa respondeu, tal e qual estava escrito no papel, sem tirar ou acrescentar uma vírgula.

Fiquei olhando para ela, em um  silêncio constrangedor,  como alguém que espera algo mais,  até que  falou:

– Mãe, eu já respondi. Está certo, pode conferir.

– Sim, mas eu estou esperando você me explicar com as tuas próprias  palavras.

Ela  franziu a testa, tentou e respondeu novamente da mesma forma que antes. Fiz outra pergunta  e  a resposta era sempre tal e qual estava no papel.

Então eu peguei sua prova, com a nota máxima estampada, amassei entre minhas mãos e falei:

– Nesse caso, minha filha, esse teu 10 vale 0, porque você decorou tudo e aprendeu nada! O que você decorou para a prova hoje, será esquecido amanhã! Eu quero que você aprenda e não se conforme com as explicações que não sejam claras para você. Eu quero que você diga “professora, eu não entendi, a senhora poderia me explicar de novo, por favor”. Faça isso quantas vezes forem necessárias, e se mesmo assim, você não conseguir entender, quando chegar em casa nós pegaremos os livros e  pesquisaremos na internet  até que você aprenda.

– Mas mãe, meus colegas vão rir de mim se eu disser que não entendi e pedir pra explicar de novo, vão me chamar de burra.

– Filha, quem pergunta pode parecer burro por 5 minutos, mas quem não pergunta, permanece burro por toda a vida. O que você prefere?

Passei alguns dias com a consciência meio pesada, lembrando dos olhinhos arregalados daquela menininha na minha frente, tentando processar e absorver o que eu estava falando… talvez eu não devesse ter sido tão dura…

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Algum tempo depois, minha filha veio com outra prova, outra nota 10, e toda feliz me disse:

– Mãe, você tinha razão, eu entendi o que você quis dizer aquele dia. Agora eu SEI tudo o que respondo nas provas. Eu não escrevo com as palavras do livro, escrevo com as minhas palavras. No começo,  quando a profe explicava e eu dizia que não tinha entendido, meus colegas riam. Mas eu não ligava, só me contentava quando tivesse aprendido. Agora, quando eles tem alguma dúvida, falam baixinho no meu ouvido “Pede pra profe explicar de novo”.

Hoje aos 16 anos, minha filha está no último ano do ensino médio e gosta de  aprender sempre mais. Autodidata, coleciona boas notas, pois sabe que elas são consequência natural do esforço do aluno comprometido, e não dependem de ninguém mais a não ser do próprio interessado.