Na internet e com fones de ouvido escolho o que quero ler e o que quero escutar. Por sorte o número é pequeno e em breve se extinguirá, mas ainda há quem ache a revolução tecnológica nociva. Afinal, “é muita informação e pouca absorção”. Pois bem, nunca na história tivemos tanto acesso a diferentes fontes de informação como hoje. Que algumas fontes não são confiáveis não há dúvida, mas quem disse que os periódicos das décadas passadas eram 100% verdadeiros? Todos sabem que não e esse é um questionamento clichê, no próximo parágrafo mudo o foco. Mas o que é mais prejudicial à sociedade? Quilogramas de informações não filtradas deixando a cargo do cidadão estudar o que é certo e o que é errado ou o que faz sentido e o que não faz sentido, ou uma única fonte de informação vendida e disseminada como “verdade absoluta”?

Reportagem de um jornal dominical mostrou uma nova febre de consumo. Depois das compras coletivas, segmento que cresceu na mesma velocidade em que decaiu, a nova febre é a dos tais clubes de compras. A pessoa se inscreve no clubinho, paga uma mensalidade e recebe no conforto de sua casa produtos específicos ou amostras grátis de marcas conceituadas ou diferenciadas. Uma das entrevistadas respondeu assim: “Os clubes têm a vantagem de pensar por você. Sem sair de casa, recebo as últimas tendências escolhidas pelo site”.

Uma das melhores obras da filmografia de John Carpenter se chama They Live (Eles Vivem, no Brasil). No longa-metragem, John Nada, personagem principal interpretado por Roddy Piper, encontra acidentalmente um óculos que o permite ter outra visão sobre o mundo, uma visão da verdade, sem maquiagem. Em anúncios publicitários e letreiros pelas ruas começa a enxergar o real teor desses conteúdos. Palavras como “obedeça” e “consuma” ocupam o lugar das bonitas imagens e frases apelativas. “Pensar por você”. É sobre isso que se trata o filme e sobre isso que podemos nos livrar, porém muitos de nós não queremos.

Então, mesmo com a possibilidade de possuir um pensamento próprio, muitos de nós não o desejamos e preferimos fazer parte da massa. Assustador pensar de maneira exclusiva? Ou assustador não fazer parte da multidão, das tendências? O comodismo nunca foi tão frequente. Não falo do comodismo físico, mas do mental. A confusão está em usar a tecnologia para pensar por si ao invés de usar a tecnologia para pensar consigo. A internet, gadgets e demais dispositivos tecnológicos só são usados com inteligência se forem aliados da mente humana e não a própria mente. Essa “facilidade” em deixar que escolham as suas tendências não torna a pessoa diferente de uma máquina ou de um produto feito em série, uma vez que a pessoa nem escolhe qual tendência seguir, mas simplesmente permite que outras pessoas, e pessoas que não a conhecem, escolham a tendência “mais adequada”, a tendência que é mais tendência no mundo das tendências. Ou seja, você paga a mais para pensarem por você e ainda chama tudo isso de “vantagem”.

Moda e tendência sempre existiram, sempre existirão e certamente não é o pior do mundo. Longe disso. Diferenças permitem intercâmbio de ideias e discussões sobre variados assuntos. Afinidades permitem aproximação por algo em comum e concordância com o outro. Seguir uma tendência não é problema nenhum. No entanto, deixar que terceiros escolham qual tendência você deve seguir sem ao menos permitir uma reflexão sobre tal ou, no mínimo, um sim ou não, é o auge da alienação. Talvez você não tenha liberdade suficiente na vida e precise enfrentar jornada diária de oito ou mais horas de trabalho, intervalo apertado para o almoço, trânsito caótico, inexplicáveis impostos a serem pagos e tudo mais. Mas você tem a liberdade de comprar o que quiser desde que seu orçamento permita, bem como absorver o conteúdo que quiser. Pena que pensar dá um trabalho…