O verão chega e praticamente metade da população se dirige às praias. Aqui no Rio de Janeiro, de um canto ao outro da cidade, você se espreme entre milhares de pessoas, mas sempre encontra um metro quadrado de areia para sentar. Eu, carioca, não curto praia, logo não passo esse sufoco — suado, exaustivo e caótico. Se você subir o dedo no mapa até o nordeste, encontrará as melhores praias brasileiras, e como a maioria das famílias pode viajar de avião hoje em dia, é para o topo do país que o sudeste e sul se dirigem. À terra dos nordestinos. Sim, aquele povo que “só sabe viver às custas do resto do país e do Bolsa Família”.
O resultado das eleições de 2014 para presidência gerou piadas, discussões, brigas entre PT x PSDB — partidários, eleitores, comentaristas do Twitter — e trouxe à tona um dos preconceitos mais vergonhosos e inaceitáveis que existe no Brasil. Não é de hoje que a intolerância ao povo do nordeste é latente na sociedade brasileira, e também não é recente vermos a discriminação por parte da população do sudeste e do sul em relação a migrantes nordestinos. Se tratando de duas regiões que se colocam no ponto mais alto do pedestal intelectual — uma delas sendo a mais importante do país —, fica incabível serem tão burras assim, e pior, insistirem na burrice ano após ano. Chega a dar um embaraço, uma vergonha alheia. Começo a suspeitar que esse pessoal pulou História do Brasil no colégio, deixando de aprender que foi lá em cima que nasceu a raiz cultural brasileira, e o mais importante, a miscigenação que tantos odeiam admitir existir aqui. Falta muita, mas muita mesmo, educação e respeito dos ditos inteligentes e de boa família.
O preconceito contra o nordestino vem daqui: linha de pobreza, posição geográfica, etnia. Sim, não é segredo que, infelizmente, o nordeste é uma região que, em sua maior parte, anda à margem da pobreza; infelizmente porque não é justo que pessoas vivam em uma realidade pesadíssima como a de lá. Esse é o primeiro ponto usado para denegrir o nordestino. Posição geográfica? É, mas esta é uma razão tão mesquinha e ilógica que não é preciso tecer comentários. E o último argumento utilizado pode ser entendido na frase “é tudo burro, pobre, favelado, e claro, tudo preto”. Daí você extrai dois preconceitos: a xenofobia e o racismo. Um remete ao outro, um é a expressão do outro. Quem sugeriu a separação do nordeste do resto do Brasil, entre outras sandices, lide com: o preto e o pobre agora estudam na mesma universidade que o playboy estuda. Cuidado, o choro é livre, mas racismo dá cadeia.
O ano de 2015 está batendo à porta e ainda tem muita gente pensando dentro de uma caixa, destilando ódio e preconceito a quem julgam ser inútil, escória, descartável. Os xingamentos que antes eram proferidos no dia a dia ao trombar com um baiano ou um pernambucano nas ruas paulistanas ou cariocas, hoje em dia encontram na internet um meio mais rápido de se espalharem. Porque é aqui que todo mundo é o dono da verdade, ou pelo menos acha que é. O “coxinha” que gasta saliva para difamar nordestinos, mas que ao final do ano, no verão, viaja para as dunas de Natal, come acarajé, se arrisca no frevo, e curte um bloco de carnaval em Salvador no ano seguinte, é o semblante da hipocrisia nojenta que se perdura há anos no Brasil, e que vai de norte a sul. Olha, não sei se é difícil entender o real significado do que virá na frase seguinte — visto que, provavelmente, o título até agora não surtiu efeito — , mas, por favor, tente mesmo assim. O nordestino é tão brasileiro quanto você.