A FIFA disponibilizou algumas opções para que as delegações escolhessem o seu local de treinamento e hospedagem. A Alemanha recusou. Decidiu se acomodar num município no Sul da Bahia chamado de Santa Cruz Cabrália. Longe dos polos, a seleção foi a que mais ganhou na Copa do Mundo – não se tratando somente de chutes a gol. E por que não tirar experiência e aprendizado dessa sua passagem harmoniosa pelo Brasil?

Ao se instalar, a seleção alemã logo recebeu uma visita de alguns índios da Aldeia Indígena Pataxó de Coroa Vermelha. Eles puderam assistir às entrevistas de alguns jogadores e foram presenteados pelos alemães com um cheque de 10 mil euros (aproximadamente 30 mil reais) para investirem em uma ambulância que facilitará o atendimento médico na região. Além disso, estão financiando a construção de um campo de futebol para os moradores do local. Os índios foram tão cordiais e receptivos quantos os jogadores, oferecendo instrumentos de sua tribo como lembrança aos visitantes. Dançaram, comeram e com certeza aprenderam lições incríveis. A seleção que trajou o rubro-negro em campo deixou a frieza – que caracteriza o seu povo – em Berlim. Vieram para o Brasil e vestiram a camisa da alegria. Ao invés de nós contagiarmos esses estrangeiros, foram eles que acabaram por encantar uma legião de fãs que foi crescendo com os dias que se passavam no Mundial. Por que ajudar a minoria de um país que não se é naturalizado? Os alemães não pensaram nos motivos, simplesmente fizeram. E fizeram maravilhosamente bem. Deram um exemplo de compaixão, solidariedade, humildade e honestidade que, inclusive, muito se falta no Brasil.

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Além disso, levamos 7×1 de uma seleção estruturada em todos os sentidos. Jogamos contra um time completo, perfeito, estudado. Vimos de maneira escancarada a crise do futebol brasileiro quando demos de cara com a organização alemã. O bom futebol da Alemanha é mais uma questão para refletirmos. Os nossos erros estão pautados na falta de muitos aspectos, como tática, jogo coletivo, humildade para aprender, pressão excessiva e respeito ao adversário. A Alemanha se mostrou completa em cada âmbito do futebol. E melhor, fez isso dentro e fora de campo. A disciplina da seleção é de se admirar e de se inspirar. Inspirar-se principalmente. É disso que o Brasil precisa: inspiração. E não nos faltam fontes. A Alemanha, desde o seu primeiro jogo contra Portugal, deixou escrito que a final teria o seu nome e que vencer era só mais um degrau a subir. E subiram firmes. Mostraram seu futebol leve e principalmente um futebol coletivo, que não se sustenta num craque. Quando Messi recebeu a bola de ouro como melhor jogador do Mundial algumas pessoas me falaram o seguinte: “Esse troféu deveria estar nas mãos de algum alemão”. Mas qual? Eles possuem uma seleção e não apenas jogadores. São únicos em coletivo. Seria difícil destacar algum.

E a principal questão que engrandeceu os alemães foi o respeito com o país do futebol. Não só com isso, mas com toda a história dos gramados e com todos os jogadores que por aqui já passaram, desde os que marcaram o nosso auge no mundo esportivo até os que hoje tentam construir os seus próprios caminhos. O meia-atacante Lukas Podolski deu a sua declaração em uma rede social, deixando todo o seu apoio e admiração para com a seleção brasileira após a nossa maior goleada em Copas do Mundo. Além disso, o jogador alemão demonstrou total respeito pela história do futebol brasileiro e por tudo que já fomos nesse esporte. Desde que chegou ao Brasil, Podolski se instalou como um brasileiro nato. Para se sentir em casa e próximo do nosso povo, o jogador fazia flashs dos seus momentos e publicava-os nas redes sociais, sem dispensar o português. Chegou-se a dizer que Podolski era o mais brasileiro dos alemães.


Toda essa educação muito me questiona se o caso em questão fosse invertido. E se o Brasil fizesse 7×1 em cima da Alemanha? Estaríamos até hoje zombando do país de população conhecida vulgarmente como gélida. Uma torcida que vaia um hino adversário não seria capaz, talvez, de aplaudir um time que foi humilhado em campo, que deixou nos gramados a vergonha de uma copa sediada no seu próprio país. Sentiríamos-nos superiores e custo a acreditar que seríamos tão cordiais como os alemães assim mostraram.

Todos eles foram exemplos pra nós e para o mundo. Não só dentro de campo, com seu futebol único e decisivo, mas também mostrando em atitudes que na Alemanha a base desse esporte realmente é a educação. Foi a educação que fez a Alemanha ser maior. É a educação que faz a Alemanha ser maior sempre. Segundo a reportagem exibida pela Rede Globo por Renato Ribeiro e Cleber Schetini, “na Alemanha, ‘jogador’ e ‘estudante’ não são palavras incompatíveis. Ao lado do estádio do Schalke 04, um dos times mais populares da Alemanha, tem uma escola pública. Desde 2001, colégio e clube têm um convênio para formar juntos jogadores e alunos. Desse projeto, saíram Özil e Neuer.” Nesse país que ainda não foi considerado o do futebol, todos os jogadores precisam, primeiramente, concluir o Ensino Médio. E ainda finaliza: “Na Alemanha, craques não surgem em escolinhas, mas em escolas”. É esse o maior legado que devemos absorver de um time tão talentoso em campo e tão inspirador fora dele. Que a taça alemã seja também um ouro para o Brasil.